Fundado no aço e conservado no frio
Fundado no aço e conservado no frio
Entre as altas temperaturas do aço galvanizado e as baixas temperaturas do bacalhau congelado, a história deste grupo familiar da Trofa escreve-se com diversificação e aposta nos mercados internacionais.
Entre as altas temperaturas a que pode chegar o aço durante o processo de galvanização que vai revestir os postes de iluminação pública e as baixíssimas temperaturas com que se congela as postas de peixe, o dia-a-dia de Sérgio Silva não poderia ser feita de maiores contrastes. É na Trofa, onde se encontra a sede do Vigent Group e a maior concentração das unidades industriais que compõem este grupo familiar, que este licenciado em gestão de empresas, com apenas 40 anos de idade, é agora o rosto de uma organização que envolve mais de 1200 trabalhadores, com operações distribuídas por 15 países e com mais de 50 % da actividade do grupo a ser canalizada para os mercados internacionais: as exportações da Metalogalva e da Brasmar são enviadas para mais de 45 países.
Se há grande contraste nos setores em que actua, há uma matriz na estratégia que persegue, marcadamente com uma aposta na internacionalização. A Metalogalva é a líder nacional na área da Engenharia e Protecção do Aço – tem 45 anos de história que a colocaram como principal fornecedora de torres de transportes de energia para empresas como a REN e a EDP, mas também como torres de iluminação pública e torres de telecomunicações.
A Brasmar é uma empresa bem mais recente (foi fundada em 2003), mas também já assumiu a liderança nacional no setor alimentar de produtos do mar congelados e transformação e comercialização de bacalhau. E como o mercado português já não lhes chega há muito tempo, as taxas de exportação da Metalogalva (72%) e da Brasmar (51%) é que continuam a justificar o plano de investimentos e as previsões de crescimento do volume de faturação: em 2016 foi de 230 milhões de euros. Em 2017 “ultrapassará, seguramente, os 300 milhões”.
Para estes resultados muita coisa mudou e o rebranding do grupo – que só em Novembro do ano passado abandonou o nome de Matalcon para passar a ser Vigent Group – afinal foi o culminar de todas essas alterações. O melhor interlocutor para relatar o fio das mudanças é ele mesmo, o chief executive officer (CEO) do grupo, que explica como se foram desenrolando os processos de decisão que lhes permitiu chegar até aqui.
Quando acabou o curso de gestão de empresas, em 2000, Sérgio Silva dizia que não queria ir “trabalhar para o ferro”. O pai e o tio – os irmãos Silva – já tinham levado a Metalogalva até à velocidade cruzeiro, e nesses primeiros 30 anos de história, o departamento comercial até era aquele que menor esforço financeiro exigia à empresa – “as encomendas chegavam por fax e e-mail. Era só dar-lhes resposta”. A partir de 2010, as coisas deixaram de ser assim, com a crise no sector da construção definitivamente instalada – também na construção metálica. Foi também o ano em que Sérgio Silva assumiu o cargo de CEO do grupo, e a aposta nos mercados internacionais passou a ter de ser uma prioridade.
Líder das mariscadas
Mas já lá vamos. Antes é preciso perceber o que o actual presidente executivo preferiu começar a fazer na porta ao lado: convenceu o tio a montar uma empresa em Portugal para importar o camarão que a família produzia no Brasil.
É importante sublinhar que o espírito empreendedor está-lhes no sangue, e Sérgio lembra-se bem de quando, com 14 anos, de férias na Bahia (onde tem seis tios maternos) o pai se apercebeu da facilidade com que conseguiu apanhar camarão. “As férias foram em Fevereiro, em Junho já tínhamos o terreno comprado máquinas a trabalhar. A fazenda de camarão da família conseguiu ser o maior exportador de camarão do Brasil. Chegámos a ter mil colaboradores e a produzir quatro mil toneladas”, recorda.
Em 2000, quando começou a trabalhar, a unidade de camarão no Brasil exportava 90% da produção. Sérgio Silva quis ser o importador desse camarão para Portugal, e começou a dar as suas cabeçadas: “Chegaram os dois primeiros contentores e eu nem tinha clientes para vender. As coisas até não correram mal, mas ao fim do primeiro ano, logo percebi que ficar com o camarão não se justificava. Precisava do know-how de quem já estivesse no terreno” – surgiu assim a Brasmar, com uma pequena empresa de Guimarães (facturava quatro milhões de euros, mas trabalhava com uma grande gama de produtos) a quem comprou 50%. Foi quando, em 2007, Sérgio Silva teimou em avançar para a componente de transformação e industrialização do pescado, que os sócios de Guimarães acabaram por sair.
Hoje, a Brasmar tem duas unidades industriais (em Portugal e na Noruega) e presença directa em quatro países. Factura mais de 150 milhões de euros. Importam peixe congelado de meio mundo – em Portugal só compram polvo fresco, para transformar – e exportam peixe para outro meio. Portugal assegura o consumo de metade da produção, mas já tem esmagadas as margens de crescimento. “Somos os líderes em Portugal na produção e venda de mariscadas. Fazemos mais de 200 toneladas por mês”, contabiliza.
Torres invisíveis na Islândia
A estratégia para a Metalogalva também sofreu profundas alterações. Quando o sector da construção tentava escapar à crise de Portugal olhando para África, a família preferiu apostar na Europa. “São mercados mais maduros, onde podemos vender produtos de valor acrescentado”, explica, lembrando-se bem das dificuldades que teve no início.
“Os nossos maiores esforços estavam na componente comercial. Se conseguíssemos convencer os potenciais clientes – as empresas de utilities de França, Alemanha, Noruega, Suécia – a virem até ao aeroporto, tínhamos a causa ganha. Hoje em dia, que o Porto está na moda, já não precisamos de convencer ninguém a vir ao São João, temos nós de nos acautelar, porque já não conseguimos receber toda a gente”, ironiza.
A capacidade industrial e o know-how no setor da Metalogalva são o seu maior cartão de visita. Hoje em dia, são fornecedores de referência em vários países. Um dos últimos contratos foi ganho na Islândia: a Metalogalva vai construir torres de transmissão de energia desenhadas por um arquiteto, estilizada em forma de árvore, com uma degradé de cores que se confunde com o horizonte. “Nós temos capacidade para fazer este tipo de produto e estes são os mais interessantes em termos de rentabilidade”.
Já são líderes de mercado na Bélgica. Na Alemanha são o segundo maior fornecedor, na Ucrânia estão a construir uma fábrica, e na Argélia outra unidade industrial. Trata-se de uma parceria com o governo argelino, que tem 51% da empresa e vai assegurar o investimento de 140 milhões que são necessários para o projeto.
Apesar de ter nascido como um grupo familiar, e de assim permanecer a sua matriz, o Vigent Group é hoje uma holding multisetorial sem membros da família nas operações do dia-a-dia, com excepção do CEO. “Somos um grupo altamente profissionalizado”, termina Sérgio Silva.